(III) Se eu fosse...

... uma atriz decadente de Hollywood eu estaria às três da tarde acordando ainda bêbada na cama de um produtor meia-boca qualquer tentando um papel de destaque num filme B. Me olharia do espelho gigante e brega do quarto e constataria que não tenho muito mais tempo nessa vida de aparências. Penso em fazer como a Cher e vender meu corpo para experiências genéticas (não tem outra explicação), mas no fundo descubro que começo a gostar das minhas rugas e do silêncio sereno que elas impõe à minha vida. O produtor meia-boca entra no quarto, e sem dar bom dia joga na cama o contrato do novo filme para eu assinar. Ele gostou da noite. Depois de tantos anos me tornei muito boa nisso. Assino sem ler e ele arranca impaciente o papel da minha mão saindo apressado enquanto grita com alguém no celular. Sozinha no quarto começo a mexer nas gavetas e dentro de um fundo falso encontro um envelope com algumas fotos. Tranco a porta do quarto e nas fotos já espalhadas pela cama, reconheço um ator do primeiro escalão de Hollywood em posições que me valerão uma fortuna. Ao passar pelo espelho novamente, já saindo com o envelope nas mãos, me assusto com a pessoa na qual eu me tornei. Largo o envelope no chão e vou embora, séria e lentamente, em busca de uma nova vida.